terça-feira, 22 de junho de 2010

Morro Serrinha e o câncer do descaso

Diário da Manhã
22/06/2010
Página 18


O atual estado de cruel abandono que caracteriza a situação vergonhosa predominante no Morro Serrinha, como bem ressalta o vereador Negro Jobs em recente artigo de opinião publicado no Diário da Manhã, é emblemático de uma enfermidade crônica chamada descaso.

É impressionante observarmos o quanto foi desprezado, ao longo das sucessivas administrações, o valioso plano original de Goiânia, concebido pelo arquiteto-urbanista-paisagista Attilio Corrêa Lima. Uma de suas preocupações centrais estava relacionada à necessidade de vigilância contra a devastação de áreas verdes, que qualificava de “exuberante riqueza patrimonial da nova capital”.

As reservas de oxigênio da cidade, porém, ao longo dos 76 anos de sua trajetória, foram sendo devastadas, contrariando todas as recomendações do “inventor” no Memorial Descritivo do Plano Original de Goiânia, entregue ao fundador Pedro Ludovico.

O Morro Serrinha é um caso típico da negação oficial às diretrizes do plano original, cujo autor também foi vítima de um conluio de interesses econômicos, que o forçou a desistir do projeto Goiânia. O arquiteto da cidade-jardim recomendou que aquele “museu vivo” do Cerrado fosse protegido.

O próprio fundador tinha uma estima muito especial por aquela área. Pedro Ludovico tinha o costume de cavalgar por aquelas terras. Inclusive, segundo diversos historiadores, como José Mendonça Teles e Ubirajara Galli, foi cavalgando por aquelas bandas que ele, sob efeito de uma visão deslumbrante e paradisíaca, decidiu pela escolha do local onde seria instalada a nova capital. O seu filho, ex-governador e estadista Mauro Borges confirma.

No entanto, aquela que é uma das últimas reservas do cerrado ainda existente em Goiânia e que apresenta flora característica com espécies nativas e originárias da época da fundação da cidade, sofre um brutal processo de degradação.

O descaso criou um ambiente favorável às ocupações irregulares, depósito de lixo e entulho, retirada irregular de terra, queima e destruição de árvores. A fauna foi extinta e a flora ainda tenta desesperadamente resistir. Até quando as autoridades competentes manterão os seus olhos vendados diante da morte lenta e implacável do Morro Serrinha?

Há alguns anos, o Ministério Público conseguiu barrar a insensatez do Estado, proprietário da área, que totaliza 97.354,58 metros quadrados, segundo o Cartório de Registro de Imóveis da 1ª Circunscrição, o qual pretendia instalar um Teleporto no local. A cidade deseja e merece ter um centro avançado de telecomunicação. Seria irracional, porém, destruir uma área histórica de preservação permanente para instalar uma estrutura desse porte, que pode perfeitamente ser erguida em outro local de Goiânia.

O Córrego Serrinha, cujas nascentes estão situadas próximo ao morro, enfrenta gravíssimos problemas, como desmatamento da mata ciliar, lançamento de lixo, entulho e esgoto.

O descaso diante da supressão das áreas verdes originais, também atinge as nossas raízes arquitetônicas, alicerçadas no art déco, e o patrimônio histórico de Goiânia. A supremacia do interesse imobiliário derruba casarões e edifícios históricos, aniquilando a memória da cidade.

A Centenária Árvore Moreira, um dos monumentos históricos mais importantes de Goiás, primeiro “Palácio” de governo da cidade, cuja sombra foi usada por Pedro Ludovico como escritório – mesmo tendo sido tombada pelo patrimônio histórico, dá os seus últimos suspiros, esmagada pelas botas do descaso. O proprietário do imóvel, na Rua 24, demoliu todas as construções para transformar o local num estacionamento.

O mesmo mal relega a um cenário que agride a consciência de todos os goianos, o monumento “Resgate à Memória”, que apresenta Pedro Ludovico montado num cavalo, em tamanho original. Essa epopeia do descaso até deveria constar no Livro dos Recordes.

A escultura, idealizada pela artista Neusa Moraes em 1983, por sugestão de José Mendonça Teles, para celebrar o centenário de nascimento do fundador de Goiânia (23.10.1891-16.08.1979), começou a ser fabricada em 1990. Sem apoio, a artista morreu, em 28 de fevereiro de 2004, aos 72 anos, deixando a obra semiacabada. O seu assistente, o escultor Júlio Valente, a concluiu. A escultura em gesso foi encaminhada à Fundiart, em Piracicaba, para o banho em bronze.

Há três anos, o monumento, que é o segundo maior do Brasil em seu estilo, está pronto, porém alojado nos fundos do galpão da funilaria, esperando que a doença do descaso encontre a cura.

Rusembergue Barbosa é vereador, presidente do Conselho de Ética da Câmara Municipal e presidente do PRB de Goiânia (rusemberguebarbosa@gmail.com)

Um elevador para o morro da Serrinha

Diário da Manhã
18/06/2010
Página 11


Temos em Goiânia uma área ecológica maravilhosa no bairro Serrinha. Trata-se de um dos raros morros da cidade com exuberante mata nativa do Cerrado. Este espaço merece ação urgente do poder público, pois estamos perdendo tempo em criar ali um santuário ecológico e turístico. A Câmara Municipal de Goiânia tem sido ativa na defesa deste morro, pois diversos legisladores já se revelaram interessados em modificar a realidade do local.

Na semana passada, estive na área de 107.398 metros quadrados, de propriedade do Estado de Goiás, e imaginei como a criatividade e gestão administrativa competentes poderiam, de fato, ser instrumento para o turismo e meio ambiente.

Sabemos da existência da proposta do Teleporto, que projetou um centro de alta tecnologia nas imediações do local. Também conhecemos os impedimentos do Ministério Público, que enxerga nesta proposta mais uma agressão ambiental em desfavor do desenvolvimento sustentável. Precisamos colocar ponto final na ideia de centro tecnológico e voltar a pensar em um parque. O que não pode é o local permanecer intocado pelo poder público, sendo espaço livre de regras e fiscalização. O Governo de Goiás deve ter vergonha em manter um local abandonado e improdutivo, sem dar finalidade cidadã a um bem que é público por sua natureza.

Na quarta-feira, apresentamos como proposta mais adequada uma variação daquela defendida pela Associação Amigos do Morro da Serrinha e vereador Rusembergue Barbosa: a construção de um Centro Turístico no local, fator que vai, de imediato, valorizar o espaço, promover o meio ambiente, turismo para a Capital e preservar a área da depredação. E mais: inibir qualquer prática de violência no local. Afinal, a vocação daquele espaço é para parque.

Acreditamos que o Teleporto Parque Serrinha, da forma como foi apresentado, gerando discórdias, iria agravar ainda mais o problema do trânsito e ocupação do solo na área próxima. Em virtude disso, sugiro a criação de um simples parque, aos moldes do que a Prefeitura já vem inaugurando na cidade. Mas também propomos a construção de um elevador que deslocaria os visitantes da calçada até o topo do morro. Trata-se de inspiração no Elevador Lacerda, de Salvador, um dos principais pontos turísticos daquela cidade.

A Prefeitura poderia cobrar taxas simbólicas para uso deste elevador, criando, com estes recursos, um fundo de investimento para o meio ambiente. Em uma simulação que realizamos, em 3D, podemos vislumbrar a cena panorâmica maravilhosa que teremos com este elevador. Imagino para esta área uma concorrência inspirado na Lei 11.079, que institui as parcerias público-privadas. É possível instituirmos um parque, uma rede de restaurantes e o elevador. Além disso, aprovaríamos também um projeto de reflorestamento do parque com mata original do Cerrado. Não precisamos seguir apenas as regras da parceria público-privada, mas outras formas de concessão. É claro que as parcerias das PPP’s são ideais para este parque, mas a Prefeitura pode apresentar dotação diferenciada da norma e optar por outros mecanismos administrativos.

O morro pode e deve permanecer como espaço voltado para a adoração cristã. Mas também deve se tornar um espaço para a família e turista que deseja ter uma belíssima visão panorâmica da cidade. Tudo isso pode ser contemplado com a atuação da Prefeitura e dos empresários que enxergarem no local oportunidade de negócios. Nós, na Câmara, com certeza, desejamos discutir este assunto.

Negro Jobs é gari, vereador e artesão. (twitter/Garinegrojobs)

sexta-feira, 11 de junho de 2010

Manifesto SOS Reservatório do João Leite

Diário da Manhã
Cidades, p. 06
08/06/10

Ao Governo do Estado, às Prefeituras da Região Metropolitana de Goiânia e à sociedade.


É preciso alertar as autoridades competentes e despertar a sociedade acerca da gravidade que representam os riscos de contaminação da água que vai garantir o abastecimento de água da população na Região Metropolitana de Goiânia até 2025. São aproximadamente 3 milhões de pessoas que utilizarão a água do João Leite para beber.

Todos os esforços devem ser sistematicamente desenvolvidos, no sentido de que o governo do Estado assuma a sua responsabilidade e a população colabore, no sentido de assegurar a proteção máxima ao reservatório formado pela Barragem do Ribeirão João Leite.

Não se pode, em hipótese alguma, tolerar ou permitir qualquer tipo de uso da represa. A sua utilização para atividades recreativas de balneário, esportes náuticos, navegação, pesca ou qualquer outra finalidade estranha ao seu objetivo, que é fornecer água potável, seria o mesmo que condená-la à irremediável contaminação. E isso comprometeria seriamente a qualidade da água consumida pela população.

A situação atual do reservatório, que integra o Sistema Produtor de Água João Leite, é extremamente preocupante e exige providências imediatas, contundentes e enérgicas, que não podem mais ser postergadas. Afinal de contas, o reservatório já entrou em operação. Está abastecendo parte da população de Goiânia. Os riscos, portanto, estão bem presentes, claros e evidentes.

Em que pese a importância fundamental daquele complexo, praticamente inexiste uma fiscalização eficiente, tanto que foram flagrados recentemente no local, por uma equipe da Delegacia Estadual de Repressão a Crimes contra o Meio Ambiente, comandada pelo titular, Delegado Luziano Severino de Carvalho, diversas fontes poluidoras, causadoras de degradação ambiental. Dentre elas podemos citar: pesca clandestina, gado bebendo água, banhistas, garrafas pet, lixo e muitas outras fontes poluidoras. Lamentavelmente, o tão temido uso indevido das águas do reservatório do Ribeirão João Leite já está sendo verificado.

Até hoje não foi instalado um alambrado, estabelecendo uma zona de proteção em torno do reservatório, para coibir e restringir a aproximação. Não há também um plano de contenção das cargas perigosas oriundas de veículos que trafegam pelas rodovias BR-060 e GO-080, nas proximidades da barragem do Ribeirão João Leite.

Medidas preventivas para evitar ocupações irregulares às margens e acidentes com veículos que transportam cargas perigosas, como combustíveis, defensivos agrícolas, substâncias tóxicas, produtos corrosivos e similares – o reservatório está próximo a duas rodovias de grande movimento – não foram adotadas. É necessário ainda garantir o cumprimento de dispositivo previsto na lei do Plano Diretor de Goiânia, que veda a instalação de empreendimentos nas proximidades da barragem.

Será que vão esperar uma tragédia acontecer para só depois tomarem as providências sobre o leite derramado? Todos os órgãos governamentais, prefeituras da região metropolitana e instituições ambientais, envolvidos com a operação do sistema, consumo, proteção, fiscalização do reservatório e prevenção de acidentes, deveriam estar trabalhando, efetivamente, de forma conjunta e harmônica para garantir o bom funcionamento e a proteção daquele patrimônio vital dos goianos.

A conjuntura tem nos mostrado que o crescimento desordenado das grandes metrópoles está contribuindo decisivamente para a escassez da água, um dos recursos naturais mais importantes do planeta. E a ausência de fiscalização adequada, sistema de proteção eficiente e consciência ecológica tem levado à degradação dos rios e até das represas que servem de reservatório para fornecimento de água para o consumo das populações. Existem muitos exemplos dessa tragédia, como é o caso da represa Billings, o maior reservatório da Grande São Paulo, mas cuja qualidade e quantidade da água estão comprometidas.

Diante dessa realidade sombria, que ameaça gravemente uma das maiores obras de engenharia na área de saneamento do país, lançamos o Manifesto SOS Reservatório do João Leite, dirigimos um apelo ao governo do Estado e conclamamos toda a sociedade goianiense a abraçar esta causa, que pertence a todos nós. Enviem e-mails, telegramas, cartas e cobrem diretamente dos parlamentares e governantes, providências neste sentido.

Sem a proteção máxima e urgente do reservatório do João Leite, o maior manancial a céu aberto da América Latina, em termos de área inundada, a nossa qualidade de vida, dos nossos filhos e netos estará comprometida.
Rusembergue Barbosa é presidente do PRB de Goiânia e do Conselho de Ética da Câmara Municipal de Goiânia.