segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Tesouro do Cerrado nas mãos do governador

Opinião
02/02/2010, p. 05
Diário da Manhã

A antiga luta da sociedade goianiense pelo salvamento e revitalização do Morro da Serrinha – área de preservação permanente, que soma cento e sete mil, seiscentos e noventa e oito metros quadrados e é a última reserva do bioma cerrado, nativo e original, ainda presente na zona urbana de Goiânia – só depende agora de um posicionamento do governador Alcides Rodrigues para um desfecho favorável. Responsável pelo caso, a 15ª Promotoria de Justiça do Ministério Público do Estado de Goiás está solicitando ao chefe do executivo estadual a apresentação de um pedido de arquivamento do Processo Judicial n.200402457174, em tramitação na 1ª Vara da Fazenda Pública Estadual, alegando a desistência do governo em construir um Porto de Telecomunicações (Teleporto), no Morro da Serrinha.

Manifesto a minha confiança de que o governador irá acatar a providência requisitada pelo MP. Afinal, ele próprio já descartou a sequência do projeto idealizado pela gestão anterior e barrado pelo Poder Judiciário de construir o Teleporto naquela área protegida pela legislação ambiental e pelo Plano Diretor de Goiânia. Tanto que, em junho do ano passado, ele lançou a pedra fundamental do Centro Tecnológico de Goiás, na área da antiga Emater, no Morro da Serrinha.

Esse Centro Tecnológico vai abrigar empresas de base tecnológica, diversos laboratórios de pesquisa, escolas de gestão do governo, institutos de certificação, além de um espaço destinado às universidades. O prédio sede, orçado em R$ 4 milhões, será o primeiro edifício público com arquitetura baseada exclusivamente nos conceitos do ecodesenvolvimento.

Por outro lado, acreditamos na sensibilidade ecológica do governador Alcides Rodrigues, que foi o titular da Secretaria de Estado do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Habitação – cargo que exerceu com honradez – na primeira gestão do chamado tempo novo. Na medida em que ele confirme oficialmente a desistência, a Promotoria do Meio Ambiente deverá lavrar um termo a ser assinado pela prefeitura de Goiânia e o governo de Goiás, definindo a implantação de um parque ambiental naquele tesouro do cerrado.

Detentor do domínio daquela área, o Estado terá ele mesmo de implantar esse projeto ou transferir o terreno para que a prefeitura de Goiânia, por sua localização na zona urbana, o faça, vindo a somar-se aos dezesseis parques já construídos nas duas administrações de Iris Rezende. O prefeito está disposto a implantar um parque à altura da importância histórica e do significado do Morro da Serrinha para a sobrevivência do bioma cerrado. A obra inclusive poderá ser feita em tempo recorde, sem dispêndio para os cofres públicos, mediante o modelo de regime de compensação ambiental com financiamento de construtoras interessadas, a exemplo de parques, como Bougainville, Fonte Nova e Cascavel.

A boa relação político-administrativa atual entre o prefeito Iris Rezende e o governador Alcides Rodrigues poderá, portanto, resultar numa saudável parceria na área do meio ambiente, produzindo como efeito o resgate de um tesouro do cerrado, com reflexos na melhoria da qualidade de vida da população.

Seria até uma espécie de retribuição do governo à municipalidade. No ano passado, o prefeito Iris Rezende, num gesto de grandeza e deferência ao governador Alcides Rodrigues, transferiu para o Estado os terrenos de quase duas dezenas de escolas estaduais na Capital, possibilitando a regularização dos estabelecimentos, que estavam impedidos de receber repasses do Fundo Nacional de Desenvolvimento (FND), por falta de regularização de seus imóveis.

Estamos, portanto, a um passo da solução do problema do Morro da Serrinha, um espaço livre constante do plano original da cidade, arquitetada por Attilio Corrêa Lima, que se constitui numa das principais referências da história de Goiânia. É preciso dar um basta definitivo à degradação daquela área que tem uma importância estratégica para a própria preservação do cerrado. Apesar do lixo, entulho e ocupações irregulares, ali sobrevivem 71 espécies dessa vegetação típica brasileira, que outrora cobria extensamente o Centro-Oeste, como jatobá-do-cerrado, ipê-do-cerrado, barbatimão, faveira, carobinha, araticum, murici, piqui, cagaita, jacarandá, bacupari, mangericão-do-campo e ipê-amarelo.

Há urgência em salvar aquele que é o ponto mais alto da área original da cidade, de onde, na década de 30, o fundador de Goiânia, Dr. Pedro Ludovico Teixeira, conforme os registros históricos e os relatos de seus próprios familiares, durante uma cavalgada se convenceu de que achara o espaço ideal para a instalação da nova capital do Estado de Goiás, depois de vislumbrar o magnífico horizonte. Como o jornalista Antônio Carlos Volpone, João Paulo Antunes, Osmar Pires e seus companheiros, responsáveis pelo Abraço ao Morro, em 2008, na maior manifestação popular em defesa do meio ambiente da história de Goiânia, acredito que o governador Alcides Rodrigues assumirá a postura de um guerreiro da natureza, assinando o documento de salvação do Morro da Serrinha.

Rusembergue Barbosa é vereador de Goiânia e presidente do Conselho de Ética da Câmara Municipal (rusemberguebarbosa@gmail.com)